Foto: Agência Phanther Média)
Wagner
Leonel nos brinda com uma lembrança do tradicional futebol na cidade do Crato e
a formação do Siqueira Campos um time que foi várias vezes campeão caririense
de futebol júnior.
Meu Tio Zé Cícero e Tia Nicéas Lira, sua
esposa, moravam em Feira de Santana (a maior cidade do interior nordestino),
que fica a pouco mais de cem quilômetros de Salvador.
Em 1975, dada a ótima fraternidade existente
entre os dois irmãos (Meu pai, Zé Lira, e o meu tio Zé Cícero) acabei passando
umas férias lá. Foram dias deliciosos, os quais não esqueço. Dentre os muitos
mimos que recebi do belo casal, que hoje mora em Recife, estava um jogo de
camisas. As camisas eram grenás, tendo um logotipo na altura do peito esquerdo
da empresa que ele trabalhava na Bahia.
Fiquei muito feliz e chegando ao Crato
organizamos um time amador e passamos a disputar os campeonatos do campo do Cariri
organizados por Tico da Liga – in memorian-.
Compunham esse time: Eu, Jânio, Marcos, meu
irmão, Manim, Jaime Macedo, Edmilson Moreira (acabou sendo até Presidente do
Ceará Sporting Clube) Caxeado, Veriano, Fernando Arroz, João Kissim (esses
quatro já não estão mais entre nós).
Algum Tempo depois mudamos para a Rua Nelson
Alencar e estreitamos relacionamento com a turma da Siqueira Campos, que também
possuía um time amador: Zagueirão, Amilton, os dois Jorge Carvalho, Marcelo
Mazaroppi, Demonteiux barba de bode, Zenilton, Etim e mais uma grande legião.
Logo, logo as convergências eram maiores que as divergências e fundimos os dois
times, sendo que do ajuntamento dos escretes consagramos o novo time com o nome
Siqueira Campos.
O primeiro uniforme foi obtido numa doação de
campanha política, do então candidato Deusimar Maciel Lopes. Era um padrão de
gosto discutível em tons preto e vermelho, em listas verticais bem largas. A
qualidade das camisas era sofrível e após algumas lavagens já haviam perdido o
viço da cor.
O Siqueira Campos, ao longo dos anos
posteriores, tornou-se o melhor e maior acontecimento futebolístico do Crato
depois de muitos e muitos anos de ostracismo. Foi várias vezes campeão
caririense de futebol júnior, destroçando quem aparecesse pela frente. Numa das
finais memoráveis, por exemplo, venceu o Santa Clara, de Juazeiro do Norte, o
então grande rival, por incríveis 6x1.
Nos seus primeiros anos de existência,
entretanto, possui memoráveis, debochadas, cômicas histórias. Compartilharei
com vocês duas preciosas joias, hilariantes mesmo.
A
primeira história divertida e uma goleada no Romeirão
Conseguimos, após incessante empenho, a tão
almejada filiação à Liga Juazeirense de Futebol Amador e, finalmente, iriamos
disputar o campeonato caririense. Os treinos foram árduos, a preparação física,
por exemplo, estendia-se pela madrugada, na quadra bicentenário, os coletivos
eram feitos às cinco da manhã no campo do São José, no bairro do Seminário. Era
uma rotina muito puxada. Eu e Jânio, recém-saídos do SESI, com ótima bagagem em
educação física, com invejáveis preparos atléticos, tornamo-nos responsáveis
para colocar o Siqueira na ponta dos cascos, como se diz no jargão do futebol.
O conjunto de jogadores era muito bom para um
início de jornada caririense, com vários destaques como Osvaldo, Pituxa, Afonso
Bruguelo, Nanida, Etim, Tadeu, Zé Mocó, Carliano, Marcos Leonel.......
O nosso goleiro era Osvaldo, que tinha um
apelido do qual não gostava muito: Burra–Pão. Osvaldo também já está noutro
plano e que Deus o tenha bem. Mas, a bem da verdade, diga-se, era bom goleiro e
havia jornadas que fechava o gol.
E a tão esperada estreia chegou. Jogaríamos na
preliminar do Icasa contra um time de Fortaleza, que não lembro agora. O túnel
que nos foi destinado, no Romeirão, exalava fricsal, óleo elétrico, iodex e
tudo que fizesse as nossas pernas brilharem. Eram os primos do gelol de hoje.
Só que usávamos em demasia, tornando a atmosfera do ambiente irrespirável. A
turma do Siqueira era barulhenta e fazia um alarido infernal ao adentrar o
vestiário.
Quem cuidava da entrada das delegações nos
túneis do Romeirão era Tico Peneirinha, que exercia rigoroso controle de
ingresso. Somente podiam entrar vinte pessoas por time. Com a nossa turma,
entretanto, era impossível ter controle, pois com a gritaria, a algazarra feita,
Seu Tico logo perdia o controle.
Ele perdia inteiramente o juízo quando Afonso
Bruguelo chamava-o de “água do mar” – o apelido que detestava. Com o nervosismo
dele, por conta do apelido, conseguíamos fazer que entrassem, não raro, trinta,
quarenta pessoas. Uma festa!! Muitos dos “convidados” levavam bola para o
campo- que não podia de jeito algum- e ficavam brincando de escanteio. Meu
Deus!
Após conseguirmos ingressar no túnel, passamos
a nos concentrar na preparação, quando surge uma inesperada notícia: houve um
problema na documentação de Osvaldo e não pode jogar. Foi aquele alvoroço, pois
com toda a preparação prévia, não pensamos em ter um plano B de goleiro.
Tínhamos de pensar rápido, senão perderíamos por WO.
Procura aqui, pensa dali e eis que veio a
ideia, àquela hora, brilhante: - Vamos colocar Lula (Júlio César Carvalho. Se
não for esse o seu nome, perdão, Lula). Pensamos: -ele já é goleiro de futebol
de salão e não terá dificuldade alguma no campo- Quanta ingenuidade!!!!
Só para comparação: Osvaldo tinha perto de
1.85m, Lula não passa de 1.60m!! Nós outros, todavia, na ânsia de estrear no
Romeirão sequer nos preocupamos com tal fator e tratamos de treinar Lula no
próprio vestiário, isso faltando pouco mais de quinze minutos para começar o
jogo. No túnel (paredes baixas, sem dimensão ambiental de um campo) Lula pegava
tudo. Aí, já sem paciência, vaticinamos:- Lula está pronto, vamos para o jogo!!
Eu era um misto de jogador e treinador, junto
com Zagueirão, Jorge Carvalho, Paulo César Ferreira, o grande líder da história
do Siqueira, ainda não estava no time. E fomos para o campo!! Um sol escaldante
naquele setembro. Mas era um sonho realizado: jogar no Romeirão!!
Jogamos contra o Santa Clara, o mesmo rival de
várias finais adiante! Meus amigos e minhas amigas, jogar é elegância de se
dizer, pois quando nos demos conta da inexpressividade de Lula ante os 2,44m de
altura da trave e os 7,32m de tamanho horizontal, deu-nos frio na barriga.
Olhando do meio do campo, não enxergávamos Lula. Mas, vida que segue, vamos
para o jogo.
Mas que jogo, minha gente?? O time do Santa
Clara, que tinha ótimos jogadores como Zeca, Muller, Chiquinho, Zim, com poucos
minutos de partida percebeu que só precisava chutar a bola para o gol, tirando
do alcance de Lula. Com quinze minutos já estava 4x0. Armamos uma senhora
retranca no restante do jogo, tentando não deixar os caras chutarem no gol,
para não sofrermos uma derrota mais humilhante do que os 7x2.
A comédia
do jogador substituído
Como o Siqueira, em seus primórdios, era mais
um arranjo coletivo, uma pelada, onde todos tínhamos de jogar, chegava um
momento da partida que precisávamos fazer substituições para que os reservas
também participassem da festa do jogo.
E eis que numa quarta-feira, Marcelo Mazaroppi
estava à beira do campo pronto para entrar, corri perto de Zagueirão e
perguntei-lhe: - Ele vai entrar no lugar de quem? - Zagueirão respondeu-me-
Doutor, (como ele me chama) resolva aí, mas ele já deu umas três voltas em
torno do campo e tem que entrar. Decida logo.
E isso o jogo continuando. Aí olhei em volta e
pensei: como Marcelo é muito limitado tecnicamente, melhor será colocá-lo na
frente, pois estamos aguentando esse empate honroso. Vou tirar um jogador de
ataque.
Aí disse a Zagueirão:- Vai lá à mesa de súmula
e diz que o Mazaroppi vai entrar no lugar de Novinho (que vinha jogando muito
bem, mas não estava passando a bola para ninguém). Zagueirão retrucou: -
Doutor, Novinho não quererá sair. -Vá lá, assim mesmo- disse-lhe.
A bola saiu pela lateral e a plaquinha subiu
com o número nove de Novinho para ser substituído. Novinho é irmão de Amilton,
um dos idealizadores do Siqueira original. Ótimas pessoas. Pois bem, quando
Novinho viu a placa foi logo soltando um palavrão e dizendo: - Eu saio é porra.
Quero ver alguém me tirar.... Nisso, o Juiz, que era Chagas Unias, famosíssimo,
disse a Novinho: - ei, seu cabinha sem-vergonha, aqui não é racha, não. Saia
logo, se não chamo a polícia. E assim procedeu-se a substituição, que rendeu,
nos dias seguintes, uma resenha formidável.