Nunca antes a classe trabalhadora brasileira enfrentou um dilema assim: optar por um emprego letal ou lutar pela vida e exigir do Estado a inversão de suas prioridades.
O Governo apostou em mobilizar sua base social com um discurso arriscado, porém racional em sua irracionalidade genocida.
A famiglia no poder sabe que não tem opção: se aceitar a união sagrada com partidos, congresso e mídia vai se tornar parte do establishment e perderá qualquer possibilidade de reeleição.
Em Movimento
O bolsonarismo só existe como mobilização permanente.
A pandemia retirou os holofotes de suas performances bizarras.
E por um motivo óbvio.
Seu discurso sempre teve como base uma doença imaginária.
O corpo nacional íntegro, são e masculino só poderia ser violado pela “ideologia” que é tão invisível quanto o covid 19.
A “ideologia” não pode ser vista, mas suas manifestações são sentidas no modo de vida.
Aquele que acredita no discurso (ideológico) contra a ideologia sabe que seu inimigo está enraizado no cotidiano.
Por mais que deseje a submissão da mulher, a erradicação da homossexualidade, o controle da educação e o fim das artes, reconhece que isso não é possível e que o “vírus” ideológico pode estar dentro dele mesmo.
O líder manipula exatamente esse sentimento para a mobilização perene.
Promete repressão para os que já se reprimem.
A Novidade
Ora, diante de um vírus real a manipulação entrou num curto circuito.
As pessoas passaram a temer uma ameaça verdadeira.
Paradoxalmente, o chamamento de Bolsonaro foi para a morte.
Isso não nos deve espantar: os alemães sitiados ainda acreditaram na arma secreta do Führer.
Na atualidade os fascistas creem no sacrifício para que continuem a rodar as roletas dos cassinos financeiros.
É claro que seu apoio popular se fundamenta em interesses reais.
Ao contrapor os efeitos da pandemia aos custos econômicos do lockdown o governo reaviva suas redes sociais e dialoga com milhões de pequenos comerciantes que fecharam as portas, inquilinos sem renda para o aluguel, famílias endividadas, os que temem uma onda de saques…
A Saída
Até que haja um remédio eficaz e uma imunização massiva para o vírus real a classe trabalhadora só terá uma saída: recusar-se a trabalhar.
Se for bem sucedida a conjuntura vai mudar radicalmente.
Porque isso só acontece a partir da base produtiva e não de disputas parlamentares.
As relações de produção são antes de tudo relações de força.
As centrais sindicais estão emudecidas diante de uma oportunidade única.
A perspectiva para uma classe que não pretende morrer é não se alistar nos exércitos suicidas que reabrirão as empresas e, se necessário, promover uma greve geral humanitária internacionalista.
É preciso declarar isso desde já.
*É professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo