20/11/2020

Por um olhar para a nossa história para além do dia 20 de novembro. Por Natália Pinheiro

 

FOTO: Gazeta do Povo 

Por um olhar para a nossa história para além do dia 20 de novembro


Natália Pinheiro  I Graduanda do curso de História pela Universidade Regional do Cariri (URCA)

 

Instituído na lei 10.639 do ano de 2003 para tornar obrigatório o ensino da História e Cultura Afrobrasileira e Africana, o dia da Consciência Negra costuma ser uma data em que algumas escolas e outras instituições se voltam para discussão de vários temas que tocam na vida de pessoas negras, como racismo, desigualdade, processo de escravização ao qual milhares de negras e negros foram submetidos durantes séculos, alguns aspectos culturais dessa população, entre outros. É uma data para se lembrar de negras e negros. E sim, é importante lembrar do crime que foi a escravidão para que não seja esquecido ou sua crueldade e desumanidade repetidas, importante lembrar para que possamos compreender os impactos desse período e de como o racismo é estrutural e estruturante da sociedade brasileira, mas é também um dia de lembrar da luta negra.

Comemorado em 20 de novembro pela memória da morte de Zumbi dos Palmares, que foi um dos líderes do Quilombo dos Palmares, símbolo da resistência negra no país, é uma data bem mais importante pro movimento negro, pois o dia 13 de maio, ao focar na suposta libertação protagonizada pela Rainha Izabel, invisibiliza toda uma trajetória de luta de pessoas negras e abolicionistas. Nem um fragmento da nossa liberdade foi dado. E ainda há de se questionar a existência, de fato, dessa tal liberdade. Desse modo, o dia 20 de novembro é um dia de memória de lutas, conquistas, mas também de reflexão sobre questões que atravessam a existência e vida de negras e negros no país, pois o Brasil é o país com a maior população negra fora do continente africano, sendo constituído por mais da metade da população, segundo dados do IBGE, mas onde se vê pouquíssimas representações em cargos de poder e mídias, sendo a população com menores salários, maior número entre a população pobre, com menos acesso a itens básicos de sobrevivência, educação e moradia, além de serem a população que mais morre fruto da necropolítica, e, no atual contexto, também os mais impactados pelo covid 19, entre várias outras questões que atravessam a existência e tentativa de sobrevivência de pessoas negras.

É de grande importância salientar que a discussões de questões étnico-raciais são evidenciadas no mês de novembro por conta do dia da Consciência Negras, mas que é necessário que não se limite apenas a essa data, pois estudar e compreender a História e Cultura de negros e negras, é compreender nossa própria História enquanto sociedade brasileira. Não existe História do Brasil sem a população negra.

Fato importante de ser salientado é a necessidade da implementação dessas questões de forma mais efetiva em escolas, principalmente escolas públicas e em bairros periféricos, porque em sua maioria é onde se encontra as crianças negras que muitas das vezes só encontram referências negativas de sua identidade ou sua história atrelada exclusivamente ao período da escravidão. Crescer em uma sociedade racista e cheia de complexidades e apagamentos e políticas de embranquecimento como é o caso do Brasil é extremamente dolorido para as crianças negras que aprendem a odiar as heranças trazidas nos traços. Nesse sentido, o papel da educação nesse cenário é fundamental também para a criação de uma consciência negra.

Para além do reconhecimento enquanto uma sociedade racista, é preciso posturas antirracistas. E que não devem partir apenas de pessoas negras. Enquanto a luta antirracista for encarada como responsabilidade exclusiva de pessoas negras, não haverá a mudança necessária. É urgente que pessoas brancas sejam antirracistas, e para além da fala. Precisamos de ações concretas no cotidiano.

Que nesse dia 20 de novembro, de celebração e memória de luta, lembremos da luta de Zumbi e de vários outros que trilharam caminhos de resistência, mas lembremos também de Dandara dos Palmares, de Preta Simoa no Ceará, de Verônica e Valéria no Cariri, e de tantas outras mulheres negras que são invisibilizadas, mas foram e são fundamentais para as lutas da população negra nesse país,  e que vieram antes abrindo caminhos e inspirando coragem para seguir trilhando possibilidades de existência individual e coletiva.

Por fim, é urgente que essas discussões estejam presentes para além do dia 20 de novembro, porque essa data é um dia de luta, mas para nós, pessoas negras, todos os outros dias também são. E discutir sobre História e Cultura Negra não é mais que discutir a própria História do Brasil. Por isso sigamos com a força dos que nos antecederam, trilhando caminhos de mudança, e escrevendo novas histórias com nossas próprias mãos.




Material publicado na edição nº 34 do Jornal Leia Sempre desta sexta-feira, 20/11, Dia da Consciência Negra no Brasil!!!!