02/06/2020

Professor Heleno C. Filho: a epidemia não está cedendo e pobres retornam ao trabalho para morrer

O BRASIL ESTÁ DE JOELHOS
No terceiro mês de ataque ao povo brasileiro durante a pandemia do SARS-COV-2, chamado de novo coronavírus, o governo federal, alguns governos de estados e vários governos municipais inventaram que “a epidemia está cedendo”.
Na verdade, cederam aos pequenos e médios comerciantes que encontram a falência e demissão de seus trabalhadores como resposta à falta de pagamento do governo federal para que o estado possa impedir demissões em massa, pague lucros cessantes de pequenos e médios, e financie a fundo perdido as grandes massas salariais com bônus de emergência.
O governo federal colocou uma granada no bolso do povo.
Os pobres retornam ao trabalho para morrer de covid-19. A pandemia explodirá nos pulmões, rins, fígados e cérebros dos trabalhadores para que sejam descartados e substituídos por quem sobreviver.
No fundo, o sinistro da economia quer que morram os maiores de 60 anos de idade, as pessoas com deficiência, os doentes graves e crônicos, para “economizar” com aposentadorias, previdência social e com Assistência Social.
Não há “retorno ao trabalho” como deseja organizar a OIT [1]
O Brasil não respeita orientações e acordos internacionais nem dos organismos multilaterais como a ONU, OMS, OMC e OIT.
O Brasil só respeita ordens de Washington, juntamente com a Hungria e seu líder fascista Viktor Órban.
As televisões que combatem os insultos toscos do governante federal concordam com o privilégio dado aos bancos.
Esconderam durante os três meses de ataque governamental e sofrimento com a pandemia que a economia nas mãos de banqueiros não tem interesse em salvar o povo.
Nenhuma rede de TV falou que podiam ser pagos os dias parados, podiam ser salvas as lojas fechadas, podiam ser pagos os microempresários sem renda.
Nenhuma rede de TV propôs a saída que os bancos não desejam. Seus âncoras falam continuamente na “voz do mercado”. “O mercado não quer”.
Por isso dizem que não existem padrões técnicos para dizer quando sair do confinamento, da maneira que alguns países estão fazendo após reduzirem a zero as mortes, e reduzirem o número de casos novos a quantidades que seus sistemas de saúde conseguem rastrear todos os contatos, isolar todos os suspeitos, testar todos os que não sentem nada.
As televisões falam do Japão, Espanha e Alemanha, como se Munique fosse aqui. Aqui é o Haiti.
Brasília tem um dos piores sistemas de saúde pública do país considerando que é a capital federal.
Brasília é governada pelos piores governantes e tem se comportado como uma cidade-estado cujo governo age como se a “epidemia estivesse parando”.
Não vamos mais argumentar sobre quem é o pior. Cada país, estado e município sabe os governantes que tem. Brasil e Brasília não são diferentes.
Quanto aos critérios de saída do confinamento, já há documentos escritos sobre isso há tempo [2].
O que aconteceu é que nenhum dos que tomam as decisões de abrir serviços na marra não precisam dessa conversa nem dessa leitura. A decisão deles segue os critérios do senhor “mercado”.
O ministro da Saúde tem tempo para ir a manifestações públicas à paisana e sem máscara, enquanto seu Ministério se desintegra, incorpora oficiais da ativa e da reserva das forças armadas em funções para as quais não têm competência nem formação.
Anuncia que vão morrer ainda muitas pessoas, como se isso fosse alguma novidade diante da incapacidade governamental de revogar a Emenda Constitucional 95 e devolver o dinheiro que o golpe de estado de 2016 tomou da Saúde.
Nunca durante a última ditadura tivemos na saúde um estoque de funcionários gratificados tão incompetentes como em 2020.
Os anticientíficos e apoiadores da concentração de dinheiro na mão dos banqueiros e investidores querem abrir o comércio, os shoppings, e colocam representantes dos comerciantes dizendo que a pandemia “está decrescendo”. É mentira!
Em Brasília, Belo Horizonte e várias outras capitais brasileiras a pandemia está em franca subida do número de casos confirmados e do número de mortos. Não é hora de abrir coisa alguma.
É hora dos governos estaduais reclamarem ao (des)governo federal que pague os dias parados das empresas para que não demitam seus empregados e que durante os próximos quinze dias não abram restaurantes, academias, manicures, salões de beleza, barbeiros, vendas de roupas, nenhuma das exceções que deveriam receber dinheiro emitido pelo governo por meio de bônus bancários para pagar os lucros cessantes e os dias parados.
O governo de Brasília é criminoso por ordenar a abertura do comércio, E os comerciantes que vão às televisões e jornais dizer que a pandemia está diminuindo estão mentindo.
Se o ministro da Economia já disse que é para deixar todo o mundo “se *” é o governador Ibanêis quem está cúmplice desta decisão sem base epidemiológica e com base na concentração de lucro financeiro contra os trabalhadores.
O governador do DF apoia a entrega de um trilhão de reais para bancos manterem a distribuição de dividendos e não tem coragem de pedir poucos milhões para dar apoio aos pequenos e microempresários com lucros cessantes e nem para que as grandes empresas parem de demitir empregados.
É necessário decretar moratória dos pagamentos de dívidas bancárias e serviços públicos como energia, água, lixo e impostos urbanos.
O governador do DF é uma exceção em relação aos demais 26 estados do País.
Não se alinhou com os demais governadores na cobrança de providências mínimas. Decidiu expor a população.
Não estão fora da crítica os deputados distritais, que estão calados com exceção de pequena minoria.
A Câmara Distrital faz as vezes de uma Assembleia Legislativa de Estado e não cumpre seu papel.
O Ministério Público do DF deveria cobrar quem será responsável pelas mortes e superlotação dos serviços de saúde que acontecerá em torno do dia 15 de junho. Ninguém será responsável?
Os técnicos da Saúde Pública que dão apoio a essas medidas estão sujando suas mãos e manchando suas histórias profissionais ao consentirem nessa barbaridade sem tamanho com clara escolha de impor o risco aos trabalhadores pobres e aliviar a economia de concentração de renda para os grandes investidores.
Os ricos estão protegidos em seus refúgios longe de Brasília, que o ministro fascista da educação tanto odeia.
Rico não vai mais pegar a COVID-19. Será doença de pobres e trabalhadores.
Querem que a população morra! Querem mais gente doente! Não querem desfazer o apartheid que reserva leitos de UTI para os que têm contratos privados de saúde e podem se proteger mais.
Esse mesmo Apartheid deixa os pobres desprotegidos pelo SUS sem leitos, sem ventiladores, e sem tratamento de referência para que Brasília fique tão ruim quanto ficou Manaus.
É crime contra a Saúde Pública em cima de crime contra os direitos humanos, em cima de crime contra a economia popular.
Tudo para não tirar um centavo dos lucros de quem tem papéis na bolsa vencendo para cobrar lucros dos bancos.
Nem o Brasil nem Brasília merecem esse crime.
*Heleno Rodrigues Corrêa Filho é médico epidemiologista,  professor  pesquisador colaborador da Universidade de Brasília (UnB)
Referências:
[1] OIT/ILO. A safe and healthy return to work during the COVID-19 pandemic – A Policy Brief. Labour Administration, Labour Inspection and Occupational Safety and Health Branch (LABADMIN/OSH) Governance and Tripartism Department Copyright © 2020 International Labour Organization [Internet]. 2020 25/05/2020; (May2020):[8 p.]. Available from: https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/—ed_protect/—protrav/—safework/documents/briefingnote/wcms_745549.pdf
[2] Corrêa Filho HR. Sem meias palavras: quando sair do confinamento? CEBES Portal Eletronico [Internet]. 2020 25/05/2020:[4 p.]. Available from: http://www.cebes.org.br/2020/05/sem-meias-palavras-quando-sair-do-confinamento/
Publicado no site Viomundo